28 de fevereiro de 2010

Amantis Agudus



Soundtrack: Los Hermanos - Primeiro andar

Parei e pensei como eu andava me deixando esquecida. Sensação perigosa, quando se começa a reparar demais nos pés, querer movimento, mas ainda assim não se saber para onde ir. Comecei a ter medo de mim ao me conhecer mais em momentos em que eu me considerei sozinha. Trabalhar com a idéia de vida levando em conta o tempo, sentimento, duração (ou falta de tal) é algo muito humano e apesar de dizerem que tudo o que é humano não se faz difícil de ser compreendido por quem é um, talvez eu seja um dinossauro diferente sendo criado em meio a um Big Bang de partículas de esquisitice. Tenho achado realmente árduo crer, sentir e achar um jeito certo de levar as coisas e isso provavelmente seriam palavras que descreveriam bem uma pessoa difícil de se tocar ou comover. Mas como explicar? Sou exatamente o contrário, sou manteiga, fácil de se deixar inquieta, boba, daquela que fala qualquer coisa numa ligação, só pra ouvir a voz, daquela que qualquer frase louca e romântica deixa o canto da boca coçando de vontade de sorrir. Não sou daquele tipo que valoriza memórias sem cor, sem cheiro e nome, não me proíbo das emoções, nem boto arame farpado no coração. Só cansei de ser pedaço, ainda mais quando o pedaço não é nem sequer uma metade. E o problema não deve ser eu, afinal os dinossauros viveram por muito tempo, embora esquisitos e estranhos. Dinossauros também deviam amar outros dinossauros e não deviam se sentir sozinhos, porque pelo menos não foi de tristeza que morreram. Dizem que foi o tal do asteróide, só não se sabe até hoje é se foi de amor. E tem outra: "isso" lá vai matar alguém? O que incomoda no amor é a fragilidade. É ser volátilssauro para alguns, brutossauro para outros e Amantis Agudus, no meu caso. Seja amor por alguém especial, amor pela vida, pela salada, pelo time de futebol, pela vizinha, pelo rosto do galã da novela, o importante é que amor não mata, a gente é que tenta matá-lo e claro, não somos asteróides capazes. Mas que idéia?!

22 de dezembro de 2009

Ventura



Soundtrack: K's Choice - Believe

E o coração diz: amar é para quem pode. Gostar chega a ser fácil, o mundo continua girando a nossa volta, a vida te tira para dançar, mas não te tira do compasso. Os momentos seguem sendo completados por encontros mais planejados, do que desejados. Gostar só exige um dia calmo e bonito, um bom papo, quem sabe um bocado de invenções, um bocado de mágoa passada, um bocado de doce em boca amarga. Gostar não exige perda de sono e nem perda de fôlego. Quando se enaltece, até chega a não desejar a separação, mas não sobrevive em meio à idas e vindas, porque logo no caminho surgem outros gostos. O coração clama, reclama, mas não se dá. E uma hora chega o amor, fazendo logo o canto da boca coçar de vontade de sorrir. Vem junto a sensação de chuva que molha e refresca. E só resta amar! O que há de se fazer?! Pacto de paz com o mundo! Admira-se as pequenas coisas, tenta-se achar soluções para os problemas do dia e nunca foi tão lindo ouvir uma musica no trânsito que fale de amor. Amor, amor... Como soa bem, como ocupa a cabeça, o coração, o ouvido, o peito, a barriga, os olhos... E o corpo vai achando lugar pra caber tanto amor assim. Mas amar dá trabalho, meu amigo. Não é companhia desacompanhada, não é sorriso com pesar, não é se esquecer de si. Amar é sim ou não! Não é aquela história de talvez não seja hora, talvez não seja eu, talvez não deva se envolver, talvez não seja doce. Não é contrato, mas não é sem alma, sem palavra e crença. Amor é doar o agasalho em troca de um ingresso para a felicidade, é querer esperar pela linha de chegada mesmo sem saber onde ela fica. É aceitar defeitos e também é aceitar perder. Aceitar que pode não ser, mas que nem por isso deixa pra trás o que foi. Amor é chute leve nas pernas, pra deixar bamba, mas sem deixar cair. É frenesi que aconchega, sem pedir, mesmo que lá no fundo se ouça uma voz que diz: atende, que sou eu.

3 de novembro de 2009

Como se fosse ontem e amanhã


Soundtrack: Sara Bareilles - Gravity

Meras tentativas, mas tão doces. Doce como te beijar, doce como quando passa alguém com o teu cheiro perto de mim e fico te procurando, na esperança de você chegar bem perto do meu ouvido e me encher o estômago de borboletas. Doce como você me abraçando, como eu te abraçando querendo entrar dentro de ti e saber o que mais tem aí dentro. Doce como o mundo que eu criei pra você dentro de mim, doce como te ver sorrindo, como te esquecer às vezes só pra lembrar novamente. Em meio a tardes, papéis, livros, fazia da sua lembrança um modo de desfazer um nó daqui de dentro, fazia da sua presença minha sorte. Te quis perto de mim não ligando para o que achassem, quis sua verdade, quis ser sua verdade. Cheguei a pensar que até se um dia eu estivesse em Madagascar, ou sei lá, algum lugarzinho que eu considere bastante improvável, ainda assim pensaria em você e talvez te escrevesse um postal pra falar de qualquer coisa. Mas hoje, sobrou silêncio. E não que ele também não seja doce! Talvez seja o tal do silêncio de respeito. Talvez as palavras traiam o que a gente sente e então é melhor não dizer nada... Hoje me peguei parada, estaca zero, não consegui ir adiante. Tenho o sério defeito de ficar pensando no próximo passo, não como sinal de desespero, nem de flutuação. Algo como pensar e guardar só pra mim, pra enfrentar o destino. Mas parei de andar, quando vi que na verdade não havia passo a frente. Agora, é hora de aprender de novo. Recomeçar: a tal palavra de sempre. Fazer o presente valer também por ontem e amanhã, fazer terça ser o aprendizado de segunda aliado ao mistério da quarta. Nem vou perguntar porque você se foi, nem vou dizer que estou triste. Não te chamo de pequena construção, nem de obra faraônica, você é uma sala aqui dentro de mim e agora só faço questão de te pintar e cuidar de você, entendendo que a sua cor mudou. Saiba que o postal ainda está de pé e quem sabe, talvez uma música ao pé do ouvido.

21 de outubro de 2009

Rien de rien


Soundtrack: Marcelo Camelo - Saudade

Era uma vez uma velhinha. Morava numa casa cheia de jardins onde vivia plantando lembranças e dizia não saber enterrá-las sem adubo, como se fazia com o rancor. Para os erros tinha um cantinho reservado, onde os maiores eram sempre regados com perdão e os menores com um pouco de esquecimento. De vez em quando, alguns fugiam e acabavam por ser plantados ao lado das lembranças e aí ela passava dias tentando consertar a escapada e colocá-los de volta no lugar. Por muito tempo a tal velhinha viveu acompanhada de um velhinho que sempre a ajudou a cuidar dos afazeres da casa, assim como nunca deixava que ela se esquecesse do quanto era necessária na vida de todos, principalmente na dele. Um dia, com a queda da última folha da árvore no quintal, o velhinho se foi, junto do outono. E veio o inverno... Os jardins ficaram abandonados, as lembranças foram secando, o rancor foi criando raízes e os erros fugiram, tomando conta da casa. Já não se ouviam mais músicas vindas lá de dentro, era um silêncio que já havia deixado de ser luto e se tornara indiferença. O assoalho foi ficando sujo e a velhinha já não se via mais como alguém importante. "Como posso seguir assim? Manca?", dizia ela. Sem plantar as lembranças, a velhinha foi ficando esquecida. Esqueceu a receita de bolo preferida do velho, do dia em que se conheceram, esqueceu do cheiro, esqueceu da risada... Esqueceu de dar uma xícara de afeto para o vizinho, esqueceu de abrir a cortina e assim esqueceu do Sol lá fora. Esqueceu a sensação de chão gelado, de cheiro de chuva, das músicas boas, esqueceu até de seu nome: Saudade. A vizinhança ficou preocupada, Dona Saudade já não vinha mais trazer mudas de lembranças, xícaras de carinho e assim a vila entrou em crise. Sentiam falta de terem a Saudade e de como ela era necessária na vida deles. Até que um dia, uma idéia surgiu e durante a noite, enquanto a velhinha dormia, entraram em sua casa. Escreveram em sua testa 3 palavrinhas e abriram a cortina, assim logo pela manhã quando ela acordasse teria uma surpresa. O Sol tomou conta do quarto anunciando que era hora de acordar. Dona Saudade acordou assustada, com um pouco de dor nos olhos e foi logo tateando seus óculos na mesinha ao lado. Assim que pôde enxergar bem, se viu num espelho a sua frente tendo a testa borrada com letras garrafais e disse em voz alta o que estava escrito: "eu te amo". Por um instante, buscou os cabelos brancos do velho até que se deu conta de que, na verdade, tudo o que havia feito durante anos ao lado dele era se amar. Se amava quando fazia o tal bolo preferido, quando plantava as lembranças, se amava aprendendo a dividir os sonhos, quando fazia história... Se amava vendo que tudo o que foi, valeu a pena, que se fez diferença. Se amava aprendendo como amar! A Saudade passou a aceitar a falta que as pessoas acabam deixando e naquele dia decidiu que chegaria de mansinho de casa em casa, de coração em coração, fazendo companhia a todos que se achavam sós, ensinando como plantar lembranças, como admirar o passado, como saber lidar com os detalhes que o coração atenta, mesmo que o destino nos tire algo que pensamos ser nosso e que na verdade, é dele.

30 de julho de 2009

Na calçada de lá


Soundtrack: Kate Nash - Birds

Mas vou arriscar nessa, comecei a te aceitar com humildade, assim como comecei a aceitar tua falta. Só que deixei dessa de "preto e branco" combinando com melancolia, me pintei aqui dentro de amarelo. Agora, passei a deixar as coisas passarem e quando dá vontade eu enfio na frente, na esperança de alguém pular para me salvar, pular junto, o que seja. Ou até na idéia de eu me deixar ser atropelada mesmo. Dia desses estava eu andando na calçada e um caminhão de coragem vinha chegando. E olha, eu tava muito a fim de ser atropelada! Na verdade, eu tinha cansado dessa de viver tentando te achar por aí, tinha cansado de você não viver dentro daqueles prazos de validade. Na verdade, não queria te perder fácil feito requeijão, mas queria você meio gelatina. Sabe? Que mesmo quando a caixa tá ficando empoeirada, quando você tira o saquinho lá de dentro e taca na água quente, fica gostoso do mesmo jeito, até pra beber na hora. E nessa brincadeira, eu seria a água, ali a toda hora, esperando para ser fervida. Durante alguns segundos, enquanto a coragem se aproximava o desejo tomou conta de mim por inteira e eu pulei. Eu apertava os olhos, ainda com medo do choque, quando olhei para o lado e te vi na calçada de lá. Me olhando, mas não me entendendo. Vi numa fração de segundos que os seus olhos não me pediam para te esperar, não me diziam: eu vou pular também, eu vou com você... O caminhão de coragem bateu, passou por cima e quase não me fez olhar para o outro lado para ver que outra pessoa tinha pulado comigo. Talvez seja importante mesmo a tal história de não olhar só para um lado. É bem verdade que te quero bem, que te deixo na parede da memória, que você se tornou um grande amigo. Só que agora faço questão de olhar por quem me olha, por quem me quer pintada de uma cor a cada dia. E do fundo do coração, sabe o que eu te desejo? Muitas ruas, com muitos caminhões... Mesmo que você esteja na calçada de lá.