17 de agosto de 2011

Vinil



Soundtrack: Norah Jones - What am I to you?

E de repente um gene de coragem brotou no seu DNA. De repente, você surgiu reformulando frases, com uma simpatia de uns quatro copos de vodca a mais. E parecia com o sorriso mais bonito, apesar do cabelo ralo. Pra disfarçar a minha surpresa, preferi olhar pra sua camiseta limpinha e criei o mantra de que "camiseta limpa não é base pra relacionamentos, camiseta limpa não é base pra relacionamentos". Cheguei a conclusão que quando o assunto é "nós", ainda me divido feito aqueles discos antigos de vinil, sabe? Lado A, lado B... Divido as faixas, divido os planos, expectativas. No lado A fica aquela menina que não quis te magoar, não quis riscar o disco, que deixou a música tocar no ritmo da banda, que pensou deixar a vida seguir o rumo que tinha que tomar. O lado A reúne a nossa coletânea de refrões mais complicados, exigindo um tom definido, cobrança, treino, muita cabeça no lugar, muita metodologia. Uma repetição de algo como "nós versus o tempo". Um tempo que nos consumiu, enquanto a gente deixava e pegava na mão um do outro como todo casal. Esse é o resumo do lado A, tendo como faixa bônus mais um mantra: "sorriso bonito não é base pra relacionamentos, sorriso bonito não é base pra relacionamentos".
Até que se vira o disco e vem o lado B. Te olhando ali fico pensando nos refrões, imagino o ápice das músicas, que ainda que repetidas, todo mundo canta, todo mundo gosta. E quase me entrego ao seus olhos que ficam cantando aquela música que eu adoro. O lado B se enche dessa fase de querer criar porções de nós, pedaços seus, entre os lençóis, entre as ruas, entre encontros com sua camisa limpa (que não é base pra relacionamentos, mas que cheira você). É o lado mais rebelde, rock 'n roll, nada cheio de moldes, mas com tanta história pra contar. São os risos espalhafatosos que a gente colecionou enquanto via televisão no domingo ou quando se esqueceu do aniversário de um ano de namoro. São os momentos em que a gente conseguia crer que contos de fadas não existem, mas que é possível ser feliz numa segunda-feira de sol bravo só de se ligar e dizer "lembrei de você". Ou então quando surgia aquela voz de gato com amigdalite pedindo colo, mas que soa como a voz da Marisa Monte cantando o clássico "Beija eu". Delícia de amigdalite!
Confesso que ao te ver ali parado, cheguei a bolar milhões de mantras na cabeça, envolvendo sua camiseta, seu sorriso, seus ombros largos, sua voz, sua nova mania de falar com as mãos, sua nova mania de simpatia pós-vodca, seu novo gene de coragem. Sorri pra você, agora desviando os olhos da sua camiseta e virei as costas, fugindo da oportunidade de ouvir tocar de novo o lado A ou o lado B. Talvez meu problema seja te olhar. Talvez nosso problema seja a falta de toca discos de vinil no mercado. Quem sabe um dia eu consiga achar um. Quem sabe um dia a gente se ache por aí.