14 de junho de 2012

Entre bulas e remédios da vida



Soundtrack: Caetano Veloso -  Você não me ensinou a te esquecer

E então chego na farmácia e peço: me vê umas doses homeopáticas de uma decisão livre e totalmente cabível a uma felicidade relativamente próxima. O farmacêutico me olha e ri: "isso a gente não tem não, moça. Você é tão bonita, por que a tristeza? Vai ser feliz ou vai acabar sozinha em um bar". Não sei até que ponto pareci uma bêbada, talvez pelas voltas nas palavras, talvez pelo bafo de solidão."Eu gosto de cerveja gelada, moço, mas tô precisando é de solução", essa foi a resposta que um lado profundo de meu cérebro programou. Até que meus pés começaram a se movimentar e me levar. Sensação de "tô por aí?", sacomé? Imagino pelo menos 9 em 10 pessoas que sentem isso agora, essa outra provavelmente está presa numa cadeia. Pois é, essa sensação que faz você vezenquando parar numa esquina e aceitar a dica de um farmacêutico, que prefere te dar uma boa pinga do que um rivotril.
O bar... O bar é um território dos amores. Gosto de dizer isso. Sempre me perco observando as pessoas sentadas, a histórias delas. Imagino amores subversivos, impermanentes. Relato para meu subconsciente pés na bunda, morte de vô, encontro de gay. O bar sustenta um clichê de beleza pessoal, espontânea (ou totalmente derivada do álcool), uma beleza calculada. Sento, cruzo as pernas e relato: as pessoas são felizes acreditando em qualquer coisa. Quem sabe de um olhar ao som de Nando Reis, você ganha um par de escovas de dentes no seu banheiro ou quem sabe, o Nando Reis nunca mais tenha o mesmo gosto. O bar é essa dualidade. Analiso um casal e imagino eles trocando o chiclete, beijando sem escovar os dentes. Criando apelidos, dando beijo de esquimó, saindo para almoçar. E ela treina um strip tease, compra uma roupa nova, faz um fettuccine ao molho branco. Ele muda as músicas do carro, pergunta se ela gosta do perfume, não toma mais café antes de encontra-la. E eles compram pipoca no cinema, se beijam e reclamam das pessoas conversando. Arrebentam nas cenas de ciúmes, brigam por quem ama mais, arrebentam nas cenas de ciúmes (de novo). Conversam enquanto tomam banho, compram almofadas novas para a casa dela, vão ao supermercado e abrem um pacote de jujubas escondidos. Eles decidem que a cerveja é Brahma e que quando tiver mais grana, pode rolar uma Original. E ela diz que ama a barba mal feita dele, ele diz que ama ela de pijama, mas ama mais quando a alça do sutiã fica a mostra (e sonha com ela nua). E eles se abraçam e ouvem Nando Reis, enquanto a mãe dela pergunta sobre ele. Enquanto a mãe dele quase não pergunta sobre ela. E aí o tempo se perde e naquele momento, já nem faz mais diferença o que é aquele bar. O que são aquelas pessoas. Pra eles, eu não sou nada. Eles se bastam, ali, efêmeros, eternos. Eles se bastam ali, nas suas doses homeopáticas de uma decisão livre e totalmente cabível a uma felicidade relativamente próxima.
Eu fecho a conta, volto para a casa, mantenho a dúvida. Penso sobre essa relatividade de acreditar que coisas boas virão, que a gente consegue se sustentar nas mãos dadas. Nessa coisa de apostar no silêncio dos olhares, na instabilidade do destino. Ou nessa coisa de se debater em crer, parar de olhar pro lado, criar o discurso de final, já treinar o tom do desculpa. Sustento essa ideia de que tenho pena da gente, dessa insustentável leveza de aparentar "ser feliz", enquanto estar sozinho é como comer chumbo. Mas às vezes, tenho alegria do que a gente consegue ser, do "eu te amo" sincero, sem precisar de muita coisa, evitando, por gentileza, muito melodrama. Evitando o rancor quando é só "tchau, se cuida" ou quando não é mais nada. Olha, a gente pede tão pouco pra ser feliz, a gente até acredita em trevo de quatro folhas. A gente desvira o sapato e protege as nossas mães todas as noites, a gente acredita nas canções de amor, a gente gosta de sorrir, a gente gosta de amar e ser amado. Então, por que a gente chora? Por que a gente não acredita mais? Por que a gente pede doses homeopáticas de uma decisão livre e totalmente cabível a uma felicidade relativamente próxima? Enquanto me questiono atravessando a rua, eu mesma me respondo. Vejo o farmacêutico entrando no bar e concluo: porque falar é fácil.

24 de maio de 2012

Se é possível descrever...

O Medina do Los Hermanos propôs no seu blog um modo dos fãs compartilharem suas emoções antes, durante e depois do show dos caras. Então, decidi arriscar (ao meu modo) e também compartilhar com vocês. As partes em negrito são as frases obrigatórias durante o texto.
Em nome do Los Hermanos, hoje o Sentimentolices brinca de ser feliz (e pinta o nariz) pra palavrear o sentimento da autora desse blog depois do show mais esperado da sua vida em Belo Horizonte. 


Belo Horizonte, 19 de maio de 2012


Na verdade, pra mim esse show começou muito antes do que quando de fato ocorreu, mais precisamente quando eu (agradecidamente) nasci numa família de músicos. Certo dia, a banda do meu pai, estilo "toca de tudo" recebeu um pedido do público pra que tocassem "Anna Júlia" num dos shows. Sou do interior de Minas e quando aparecia algo diferente do habitual o questionamento era sempre esse: essa música já chegou aqui? No ano de 2000, eu com meus 9 anos de idade, conheci o famoso pedido. Lembro da música, enfim, ser tocada nos shows e do refrão entusiasta que levava todo mundo a cantar junto (até George Harrison). Confesso que o tempo passou e esqueci quem era Anna Júlia, por isso mesmo o show começou antes mesmo de eu imaginar. Por sorte, em 2004, tive a Ventura de me tornar mais próxima dos Hermanos. Foi quando, já mais velha, depois de doses cavalares de musicalidade dentro de casa, aprendi o valor de harmonia, letra e sentimento. Me apaixonei, essa é a verdade. Mas com 14 anos de idade, dizer "mãe, me deixar entrar num ônibus e ir atrás desses tais de Los Hermanos" era pedir pra ganhar não. O tempo passou, as músicas enfiaram na cabeça a ponto de cantar os metais da banda junto com o cd (algo típico dos fãs). E em 2007, eu, numa cidade pequena, ganhei um prolongamento nas reticências da espera por ouvi-los ao vivo. O fim da banda gerou a busca por covers em Juiz de Fora, Belo Horizonte, Uberaba e só alimentava o sonho de poder me emocionar com um show de verdade. Até que no dia 15 de novembro li no blog do Medina "2012 será o ano de turnê do Los Hermanos". Os olhos brilharam e desde então o tempo voou. Esperar pela meia-noite do dia da venda de ingressos foi como esperar pelo DVD do "Cine Iris" de presente de aniversário. Ingresso garantido, passagem comprada, todas as músicas decoradas  e então finalmente era chegado o dia do show. Assim que entrei no local, observando a plateia, logo percebi que aquela noite seria Sentimental. Depois de subir as escadas, que davam pro segundo andar do Chevrolet Hall, estar ali era como entrar num banho depois de um dia cansado. Era se iluminar com os sorrisos dos outros, que se misturavam aos seus, que embalavam os gritos de espera, que tomavam conta das batidas do coração. Estar ali era ser tomada por uma vontade de não sair antes mesmo de começar. Sem me preocupar se eu estava longe de ver a barba do Camelo, as danças do Amarante, o sorriso do Medina, a seriedade do Barba... Sem me preocupar se eu estava amassada em meio a tantos corpos, estar ali era simplesmente esperar por um sonho. Após alguma espera, a expectativa só fazia aumentar, até que finalmente a banda surgiu no palco e o que aconteceu deste momento em diante poderia ser descrito como permitir uma graça que só a música nos dá. Não conseguia ouvir o meu grito, que virou um grito único de milhares de pessoas. Descobri o poder do corpo humano por não ter meus dois pulmões expulsos do corpo junto com um coração que acelerava a cada "uh, los hermanos, uh los hermanos". Era como se todos pedissem pra que tocassem logo, depois de anos de espera. Era como esperar um presente... Logo quando começaram a soar os primeiros acordes da música de abertura, a impressão era a de que aquele lugar havia se transformado em um sonho, enfim, palpável... Enfim, audível. Eram sonhos reunidos e isso dava ao solo de "O vencedor" uma impressão de hino nacional da nação Hermânica (pra não dizer, Hermaníaca). "Olha lá" nunca teve tanto peso no meu peito. Bateu e saiu pelos olhos. Os versos seguintes foram acompanhados de um choro sincero, um choro agradecido. Não um choro vinculado somente à imagem de tê-los ali, mas também vinculado ao som, as guitarras, as batidas, ao teclado, aos metais, ao que eu chamo de prazer auditivo. Lembro de olhar pra minha irmã numa passada de olhos e vê-la emocionada ao me ver ali, totalmente entregue a um encontro esperado por anos. Nos segundos de solo, pude lembrar de nós duas brincando no carro durante uma viagem "fala um show que você sonhou ir". E enquanto ela dizia artistas mortos, eu respondia: Los Hermanos. Vivos e únicos, porém parados. Enquanto as lágrimas desciam paradoxalmente, o sorriso abria e o show foi seguindo seu curso, tendo o repertório passado por todos os discos lançados. Agora, sem dúvida, o melhor momento da noite foi quando ouvi Primeiro Andar. Como orar durante as noites, o meu reflexo foi fechar os olhos e esquecer tudo que existia a minha volta. Mesmo estando no segundo andar do Chevrolet Hall, consegui conhecer algum terceiro andar que fica por aí. Me enchi de todo o sentimento e acho que refleti tudo que ela significa pra mim. Quando perdi meu pai, o mesmo que me ensinou tudo que eu sei da música, Primeiro Andar era um mantra pra que meus dias fossem recheados de coisas boas e que assim eu contasse pra ele, em algum lugar, "quem vai saber?". Assim como acho que agora, escrevo e conto o que eu vi pra ele também. Acho que ele me viu, guardando um sonho bom, vivendo esse sonho. E quando tudo parecia estar terminado, ainda havia o bis e "Tenha Dó" tomou conta das minhas pernas e braços, me tornando mais uma "Bubu dos trompetes" que se fez ali. Lembrei de quando eu dançava essa em casa, sozinha e foi como imaginar tantos outros que deviam fazer o mesmo podendo dividir comigo aquele momento. Euforia total do primeiro acorde, passando pelo refrão até o "laraiá" final. Depois de quase 30 músicas, "Pierrot" sinalizou o fim da festa. As luzes se apagaram e a turnê seguiu adiante, para outras cidades. No futuro, quando for contar as pessoas como foi o show, vou dizer que essa noite será sempre lembrada por ter sido a demonstração da alegria simples que é estar diante da realização de um sonho. Cada minuto, cada momento, teve um tom especial, um dom de saber envaidecer por se saber que ouvi-los ao vivo era tão melhor do que qualquer sentimento imaginado. De modo engraçado, quando os músicos deixaram o palco com o final do show, soltaram aquela música "Não se Vá" da Jane e Herondy e nunca cantei com tanto apreço algo que queria dizer pra cada um deles: "não se vá, não me abandone por favor, pois sem você vou ficar louco". Não sei se louca de saudade, não sei se louca de vontade de dizer "obrigada" repetidas vezes ou de ver muitos outros shows, ouvir muitas outras músicas, mas sei que sempre louca pelos meus Hermanos.

11 de maio de 2012

Do fundo do meu coração



Soundtrack: Adriana Calcanhotto - Do fundo do meu coração

Possibilidade deveria vir com bula. "Recomenda-se pés nos chão durante todo o uso. Evitar super dose e não misturar com o sentimento dos outros. Aplicação oral". Acontece que entre um lance e outro de uso, a gente se engana. Tomar a possibilidade é simplesmente não tomar nada, além da dúvida. Efeito placebo. Acontece que entre uma dose e outra sempre cabe um pouquinho de invenção, saudade, planejamento. E sobra espaço pra se decepcionar. Sobra espaço pra se esperar por alguma coisa que caia do céu, uma resposta mirabolante,  um momento especial capaz de transformar totalmente o foco da situação, capaz de levar a gente junto.
Fiquei pensando no que essa vida promete pra gente. Se é algo contagiante a mania de me enfiar em coisas idiotas, de insistir em pensar o que eu quero de você, sem nem saber o que eu quero de verdade pra mim. Não sei se isso é medo, se tem alguma relação com minha desconfiança até de tentar atravessar a rua quando o sinal está amarelo. Não sei se tudo só parece sair do lugar sem girar ou se por tudo realmente ter girado, você saiu do lugar em que eu te encaixei (ou do lugar onde talvez você nunca coube). Me diz então, como é que se espera por algo que não chega? Onde é que eu caibo nessa história? Quando é que eu fico doce, deito na cama e vejo a beleza de estar sozinho? Me diz como se olha pro teto sem parecer que ele está prestes a cair? Me explica como se diz boa noite sem a impressão de que o dia se encheu de coisas prestes a explodir num simples fechar dos olhos? A questão é que essa cena tá velha: as pessoas mudam e mentem. E nessa urgência de verdade a gente opta por qualquer caminho, independente do destino. Até cair de novo em visões paranormais do que se pode ser, de coisas que podem aparecer ou simplesmente desaparecer. Até se entupir, até se esvaziar.
Não menti, eu assumidamente te quis e até tentei te procurar depois de tudo, mandei uma ou duas mensagens, sem resposta. Na teoria, penso em você confuso, sentado no sofá, numa sexta a noite, pensando "meu Deus, o que se passa na cabeça dessa menina? Como ser sincero e não parecer um babaca?". Na realidade, vejo você parar qualquer coisa que está fazendo, ler a mensagem e jogar o celular num canto, solubilizando no silêncio todo o remédio da possibilidade. Vejo você se dissolver entre as minhas veias, artérias, oxigenar meu cérebro, dar um "barato", até ser eliminado pelos olhos. Talvez seja isso, não tem como explicar, às vezes acabamos sozinhos por acreditarmos muito na hora errada e ficamos olhando pro teto, olhando pras pessoas, colocando vírgulas no caminho. Ou tentamos nos apegar à ideia de que quando menos esperarmos algo vai acontecer e enfim vamos assinar um contrato vitalício com a verdade, mesmo que seja até amanhã de manhã, mesmo que a gente continue com medo de atravessar a rua com o sinal amarelo. Acho que essa história acabou de perder o poder. Dissolveu, feito seu silêncio, feito a nossa mentira. Enfim, chegou nosso dia de contrato vitalício com a verdade, sendo que ela agora já não importa tanto mais, importa? Nossa verdade veio com o tempo e a partir de agora, vai embora com ele. Estar longe é quase esquecer.

26 de março de 2012

Previsão do tempo



Soundtrack: John Mayer -  Comfortable

Me diz então: como é que você cabe em tanta coisa? Você cabe no barulho de chuva batendo no vidro da sacada, cabe na rúcula, na mostarda, no barulho que os pneus fazem dentro da garagem quando chego em casa. Você cabe nas 500 histórias que eu conto sobre como as pessoas aprendem a ser independentes e cabe até no meu cansaço de trabalho. Você vira cada gota de água que cai do meu chuveiro, cada música que sai dos meus fones de ouvidos, você vira cada vazio que ecoa ao final do dia. E aí lembro de quando te conheci e não dei a mínima pro seu jeito relaxado, pro seu papo repetido. Mas não lembro onde você me ganhou, não lembro em que parte daquele encontro você me arrancou um sorriso daqui de dentro que não me fez te atirar contra as pedras, como eu costumava fazer com as pessoas que tentavam se aproximar de mim com litros e litros de clichê barato. Não lembro se eu sorri, mas lembro que você sorriu, branco, verdade, mentira. Não sei se minha perna tremeu, mas sei que você usava uma bermuda xadrez linda e reparei na sua panturrilha quando você se virou (e ela também era linda). Não lembro se eu arrepiei, mas lembro que sua mão tirou minha franja do olho, na mesma velocidade em que eu via seus olhos úmidos e dilatados no escuro da falta do que dizer. Não lembro o que eu fui, mas lembro tudo o que você fez. Não lembro se te contei que gostava de homens charmosos, mas lembro de você me roubando um selinho enquanto eu falava, seguido da minha boca aberta partindo para um sorriso. Desconfiada, você me desarmou. Colou uma junção de mãos por cima do momento e me girou, te vendo passar pela minha retina embaçada. Não lembro se meu coração bateu forte, mas lembro de você olhar pra mim enquanto eu girava e dizer: me dá seu telefone. E eu dei. Feito jogo de bingo, cantei todos os números e quase perguntei: você anotou mesmo? Você vai me ligar mesmo? Isso é verdade mesmo? Diante de tanta gente, não lembro se você pareceu ser meu, nem se eu pareci ser sua, mas talvez chegamos a ser alguma coisa do tipo "nós".
É engraçado dizer isso, mas meu último olhar pra você naquele dia foi um dos melhores que eu já dei num primeiro encontro. Foi como sentir o coração batendo forte só de se encostar o joelho, foi como sentir o canto da boca coçar de vontade de sorrir. Depois que você foi embora, a anestesia passou. Deixei meu número ser só um sapatinho da Cinderela e mais fácil do que ficar procurando de pé em pé, agora era só me ligar. E lembro da sua primeira mensagem: "já estou com saudades". Sem te ter por perto, pude observar como eu ficava quando o assunto era você. Queria escrever tanta coisa, pra falar de tanta coisa, até me freiar num: "eu também :)". Cheguei a lembrar daquilo que os antigos costumavam dizer sobre ternura e que eu já não acreditava. Talvez ali o mundo sacudiu, seguidos de outros sorrisos, beijos, joelhos, barrigas, coxas, arrepios bons, sapatinhos de Cinderela. Por algum tempo, senti sua falta. Mas ficou grave quando senti sua ausência, com seu carimbo, sua assinatura, minha responsabilidade. Nesse vazio com seu nome, preferi sorrir e parecer independente, como as 500 histórias que eu aprendi a contar. Preferi falar que a gente se encontra por aí, enquanto eu conto os dias num calendário sem data prevista. Porque sei que isso vai te dar medo, como todas as outras coisas que tentam te desviar do seu percurso, que tentam te dar saudade de coisas que nem foram. E estranhamente, sem te tocar, a sensação é de que você agora parece bombril limpando meu amor próprio, meio enferrujado, meio sujo, meio velho. Como se nesse sumiço você mandasse o recado: troca o freio.
Não sei se estou bem, se estou mal, se estou pro que der e vier ou se só estou aqui precisando selecionar melhor as músicas (que doem mais) no meu MP3. Não sei se Deus aceita pedidos amorosos ou se é nessas horas que ele pisca os olhos e não presta mais atenção. Mas talvez se Ele só puder me ouvir, quero pedir o gosto de rúcula na boca de volta. Quero que a chuva não me incomode por lembrar de você deitado com meu rosto no seu peito. Quero só sentir o cansaço do trabalho, sem ter que pensar se você também está cansado, se também pensou em mim, se também sentiu vontade de me mandar uma mensagem. E até você decidir aparecer, só me ensina como caber nas minhas coisas também. Ou me ensina a ter medo de ser feliz com você, porque acho que vai começar a chover e, agora, você já sabe o que acontece.

12 de março de 2012

Let me be



Soundtrack: Bon Iver - Flume

Antes de você falar, não me culpe. Eu tenho essa péssima mania de ser mandada pelo meu coração e vezenquando ele diz coisas que eu não sei filtrar. Não me culpe se ele te escolheu para olhar. Não me culpe por não saber filtrar esses olhares em cima do que é, em cima do que pode ser, em cima do que não foi (e nem será). Ainda não sei até onde vai a linha entre as vontades que vivem e as vontades que morrem. Não sei onde se esconde a simplicidade que é ignorar, virar a página, esquecer. Não sei em que ponto as renúncias acabam se recolhendo e dando lugar a uma segunda chance de te olhar com carinho. Não sei como você injetou esse doce dentro de mim, fazendo essas formigas andarem por todo meu estômago quando me aproximo da ideia do quanto dava pra ser feliz. Ou será que elas só se mexem de fome? Sem comida, sem doçura. Pedindo um asilo, um novo lugar pra viver ou então só um destino pra iniciar o nomadismo. Bate aqui no meu peito, sente o oco? Pois é, eu tô tão cheia e mesmo assim pareço não ter nada. Talvez esse barulho seco vem dos vários "quase" que você empilhou aqui dentro de mim. Quase feliz, quase diferente, quase juntos. O que era "um mais um igual a dois" virou uma conta estranha, uma operação matemática difícil de resolver. E nessas horas onde se meteu a minha intuição? Nunca foi boa com contas e ainda assim fiquei ali tentando nos resolver. Somei, multipliquei e não adiantou: em resultado pequeno qualquer subtração maior do que a gente é vira número negativo. O mal dos relacionamentos é esse, não queremos nos machucar, mas quando isso acontece escolhemos sofrer. A gente tem dias de adorar ver a casquinha da ferida crescer, mas temos dias em que gostamos mais ainda de ficar arrancando pedacinho por pedacinho. E depois de tirar tudo, deixamos a carne ali pra mostrar e exemplificar a dor. A gente precisa esmurrar o coração, bater a cabeça, machucar o corpo. A gente esgota as possibilidade até que surge uma força interna, maior do que a dor que diz: tá na hora de parar de arrancar casquinha. Nesse momento você percebe que desarrumar a casa te faz perceber o quanto é bom ter as coisas no lugar. Quando estamos em ordem aqui dentro, sabemos exatamente onde procurar o que precisamos. Sabemos que naquela gaveta ficam os sorrisos, enquanto naquela cômoda a gente guarda o amor próprio.
Antes de você falar, não me culpe. Me deixa te agradecer pelo que foi e só me dá um murro bem dado, pra machucar e ver que nisso tudo você não sente nada, nem uma dorzinha na mão, porque você é forte e quem sempre acaba doendo sou eu. Mé dá um murro pra machucar, pra dar ferida. Me deixa tentar te ver ali naquela casquinha crescendo esquecida, sem a mínima vontade de mexer. Me deixa tentar descobrir onde você morre nessa história, porque eu já tô cansada de saber só onde você nasceu. E aproveita que já tá batendo e mata essas formigas que você enfiou aqui.